domingo, 21 de agosto de 2011

aconteceu no USA

No limite

PAUL KRUGMAN
Colunista do "The New York Times" Prêmio Nobel de Economia em 2008

Em aproximadamente um mês, se nada for feito, o governo norte-americano atingirá o limite da sua dívida estabelecido pela lei. Haverá consequências terríveis se esse limite não for elevado. Na melhor das hipóteses, haverá uma redução da atividade econômica; na pior, voltará a crise financeira de 2008-2009. Portanto, poderíamos considerar um fracasso se o teto da dívida não for aumentado? Nem tanto.

Analistas continuam complacentes acerca do teto da dívida; segundo eles, a gravidade das consequências, no caso da não elevação do teto, assegura que, no fim, os políticos farão o que precisa ser feito. Mas essa complacência deixa de lado dois fatos: o extremismo do Partido Republicano e a necessidade urgente de o presidente Barack Obama estabelecer um limite na extorsão republicana.

O limite da dívida federal é uma peculiaridade estranha da lei orçamentária norte-americana. Como a dívida é consequência das decisões sobre impostos e gastos, e o Congresso já toma essas decisões sobre impostos e gastos, por que exigir uma votação extra sobre a dívida? Além disso, tradicionalmente, o limite da dívida é tratado como um detalhe menor. Durante o governo do presidente George W. Bush - que acrescentou US$ 4 trilhões à dívida nacional -, o Congresso, com um pouco de fanfarrice, votou a favor da elevação do teto da dívida nada mais, nada menos que sete vezes.

Então, o uso do teto da dívida para extorquir concessões políticas não é algo novo na política norte-americana. E parece que isso surpreendeu Obama.

Em dezembro, após Obama concordar em estender as reduções de impostos da era Bush - medida que muitas pessoas, eu inclusive, viram como uma cessão à chantagem republicana -, Marc Ambiender, da revista "The Atlantic", perguntou por que o acordo não incluiu uma elevação do limite da dívida para evitar antecipadamente uma situação "com reféns" (nas minhas palavras, não de Ambiender).

A atitude do presidente pareceu tola até mesmo naquele momento. Ele supôs que "ninguém, democrata ou republicano, vai querer ver toda credibilidade e crédito do governo dos Estados Unidos irem por água abaixo". E ele tinha certeza de que John Boehner, presidente da Câmara dos Deputados, aceitaria suas "responsabilidades em governar". Bem, já sabemos o que aconteceu.

Agora, Obama estava certo quanto aos perigos de não se elevar o limite da dívida. Na verdade, ele subestimou a situação ao focar apenas na confiança financeira.

Não que isso não seja importante. Um fracasso na elevação do limite da dívida - que, entre outras coisas, atrapalharia os pagamentos da dívida já existente - poderia convencer os investidores de que os EUA deixaram de ser um país sério e responsável, o que pode acarretar consequências graves. Além disso, ninguém sabe o que uma moratória norte-americana provocaria no sistema financeiro mundial, que é construído sob a suposição de que a dívida do governo dos EUA é o bem mais seguro do mundo.

Mas a confiança não é a única coisa em jogo. Um fracasso em elevar o limite da dívida também forçaria o governo norte-americano a realizar cortes drásticos e imediatos nos seus gastos, em uma escala que colocaria no chinelo a austeridade imposta sobre a Grécia. E não acredite nas besteiras sobre os benefícios dos cortes de gastos que tomaram grande parte do discurso público: reduzir os gastos em um período no qual a economia está profundamente deprimida destruiria centenas de milhares (e possivelmente milhões) de empregos. Então, a falta de acordo na questão da dívida teria consequências muito ruins. Mas eis o problema: Obama precisa se preparar para enfrentar essas consequências se ele quiser que sua presidência sobreviva.

Não se esqueça de que os líderes republicanos não se preocupam de fato com o nível da dívida. Pelo contrário, eles estão usando a ameaça de crise da dívida para impor uma pauta ideológica. Se tinha alguma dúvida sobre isso, a discussão da semana passada deveria ter lhe convencido. Os democratas engajados nas negociações da dívida argumentaram que, já que supostamente estamos com problemas fiscais, devemos conversar sobre uma limitação dos impostos para as corporações e fundos de investimento, assim como uma redução do auxílio aos pobres e desafortunados. E os republicanos, em contrapartida, simplesmente abandonaram as negociações.

Então, podemos nos preparar para uma extorsão pura e simples. Como destaca Mike Konczal, do Instituto Roosevelt, os republicanos chegaram com um porrete e declararam: "Que economia bonitinha que vocês têm aqui. Seria uma pena se algo acontecesse a ela".

Eles estão fazendo isso porque devem acreditar que vai funcionar. Obama cedeu aos cortes de impostos, e eles esperam que ele ceda novamente. Acreditam que estão com a situação política sob controle, já que a opinião pública culpará o presidente pela crise econômica que eles estão ameaçando criar. De fato, é difícil evitar a suspeita de que os líderes republicanos realmente querem que a economia vá mal.

Em suma, os republicanos acreditam que encontraram o ponto fraco de Obama, que ele pode ainda estar morando na Casa Branca, mas que, por motivos práticos, a Presidência dele já foi por água abaixo. É hora - até já passou da hora - de Obama provar que eles estão errados.

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